22 janeiro 2016

ENSINAMENTOS POÉTICO-CIENTÍFICOS

ENSINAMENTOS POÉTICO-CIENTÍFICOS 


Por: ALESSANDRA LELES ROCHA
Professora, bióloga e escritora - Uberlândia - MG


Um novo dia e suas infinitas possibilidades de nos surpreender. Pelas janelas da tecnologia deparei-me com uma matéria referente ao físico britânico Stephen Hawking, na qual ele tece considerações em relação ao comportamento autodestrutivo dos seres humanos e a eventual necessidade de buscar outros planetas para garantirmos a sobrevivência da espécie. Até certo ponto, uma manifestação fácil de ser compreendida por qualquer um, bastando só um pouquinho de observação sobre o cotidiano do mundo.

Mas, para mim, a surpresa mesmo foi a conexão imediata entre as reflexões científicas do grande gênio e a poesia magistral de Carlos Drummond de Andrade, em “O Homem, As Viagens”; escrita como crônica, em 1969, no Jornal do Brasil. Com a alma mineira, de quem traduz as palavras até do silêncio, o poeta retrata a inquietude do ser humano em conviver, ao ponto de precisar viajar e “experimentar, colonizar, civilizar e humanizar” outros mundos.

Depois de anos e anos, relendo e me encantando com esses versos de Drummond, agora percebo que ele e o grande cientista desfrutam de algo em comum nas suas considerações: de que a culpa dessa ânsia desenfreada não é da evolução tecnológica. A capacidade humana é ilimitada e incapaz de permanecer restrita e intocada pelo tempo. As cabeças sonham pensam intuem inventam... Do fogo pré-histórico fez-se o princípio da luz da Razão. A máquina é filha do homem e não há como voltar atrás.

Mas a genialidade perturba desinquieta. A impossibilidade de se enxergar todos os prismas de uma mesma questão é inevitável e a balança, também, não consegue manter o firme propósito de se equilibrar entre os erros e os acertos. O bicho homem ainda é bicho por excelência. Instintos que vêm arduamente sendo domados, à custa de muitas idas e vindas, muitos sacrifícios e resultados, tantas vezes, aquém das expectativas. Não é à toa que ele caia sempre nas tentações de si mesmo, ou no que a Igreja Católica, no fim do século VI, expressou como os sete pecados capitais: luxúria, gula, avareza, ira, soberba, vaidade e preguiça. Por isso, nem sempre ele é bom justo e belo na construção do seu caminho.

Desbravar outros espaços, portanto, não foi nem será a garantia da sobrevivência humana se algo muito maior não lhe tocar os sentidos. A vitimização tem sido um instrumento utilizado por séculos e séculos para encobrir o próprio descaso e a alienação do ser humano diante dos desdobramentos e repercussões de seu comportamento; mas, tudo tem um limite e este chegou. Nada é de graça e o custo dessa permanência infantilizada e impertinente no protagonismo vitimista já ficou oneroso demais. A tal ‘genialidade’ subiu-lhe à cabeça, entorpeceu o bom senso, ultrapassou as barreiras da atmosfera, do som, do visível e do invisível.

Mudar de ‘casa’? E daí? O cenário não altera o curso das relações humanas, afetivas, sociais. A poesia e a ciência esperam mais de nós. Esperam que nos tornemos a tal ‘metamorfose ambulante’ que não tenha medo de ousar, de experimentar, de se recriar em nome da sua auto sobrevivência. Não uma sobrevivência que olhe apenas para o próprio umbigo, ou seja, que não polui o próprio espaço, mas não se importa de poluir o dos outros. Ou que distribua donativos e esmolas como se fizesse algo de extremo altruísmo, mas não reivindique pública e humanitariamente por uma justiça e igualdade sociais. Enfim...

A verdade é de que não é preciso sair do lugar onde se está para se permitir transformar. Segundo a filosofia chinesa do Taoísmo, dentro de cada ser encontram-se duas forças opostas e complementares, o Yin e o Yang; as quais se deve aprender a harmonizar. É nessa busca diante do dualismo existencial que o indivíduo se transforma, evolui onde quer que esteja. A única exigência nisso tudo é de que esteja plenamente disposto, consciente dos desafios que terá pela frente. As asas da borboleta não são tecidas sem uma dose de sacrifício; por isso, o resultado é tão sublime que ela se permite ostentar toda a sua beleza libertária.

Assim, podemos conquistar o universo inteiro se quisermos. Desbravar e apontar a magnitude da razão humana com bandeiras e símbolos por quaisquer lugares. Mas, parece-me pequeno demais utilizar de todo esse potencial, como mero pretexto para não conquistar a si mesmo. Quantos mundos existem dentro de nós? Quantas luas regem nossos sentimentos? Sabemos quem é o (extra) terrestre que habita nossa alma? Como disse o poeta: [...] Restam outros sistemas fora do solar a colonizar. Ao acabarem todos só resta ao homem (estará equipado?) a dificílima dangerosíssima viagem de si a si mesmo: pôr o pé no chão do seu coração experimentar colonizar civilizar humanizar o homem descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas a perene, insuspeitada alegria de con-viver.

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